Moradores do município de Santo Antônio do Içá, a 881 km de Manaus, afirmaram ter sido atendidos pelo mesmo médico que prescreveu uma dosagem 10 vezes maior de um medicamento para tratar a alergia de um bebê de 10 meses que morreu no domingo (8).
Sem registro no Conselho Regional de Medicina, o médico foi exonerado em fevereiro deste ano pela prefeitura após determinação do Tribunal de Contas do Estado (TCE-AM). Entretanto, alguns pacientes do Hospital Público do município afirmaram ao G1 que receberam atendimento do médico no período que ele, supostamente, estaria afastado do cargo.
O bebê Henzo Matheus Pinto Elias morreu na tarde de domingo, após passar seis dias internado na unidade. O bebê foi atendido melo médico Diedre Henrique Arce Foster, que foi exonerado do cargo em fevereiro deste ano. Na receita assinada por ele, é recomendado o uso de dipirona e 25 miligramas de prometazina – medicamento usado para combater reações alérgicas.
Diedre Foster foi contratado como médico cirurgião pela prefeitura de Santo Antônio do Içá no dia 1º de junho de 2016. O nome dele consta na relação de servidores da prefeitura de dezembro de 2017. Foster consta na folha de pagamento do Município até o mês de fevereiro deste ano, quando foi exonerado pela prefeitura.
Em nota, a prefeitura do município afirmou que Foster, “por saber da enorme demanda no Hospital Dom Alberto Marzi, estava fazendo trabalho voluntário por 10 dias, estando com a sua viagem de saída do município marcada e agendada.”.
Entretanto, moradores de Santo Antônio do Içá relataram ao G1 que já haviam sido atendidos pelo mesmo médico nos meses de março e junho, quando ele deveria estar afastado.
A aposentada Maria das Dores Cavalcante, de 59 anos, afirmou que foi até o hospital após passar mal em março deste ano.
“Estava com pressão alta e ele me consultou. Eu cheguei lá passando mal e me consultei com ele, ele passou uns exames, uns remédios e fiquei melhor, mas não sabia que ele tava afastado”, disse.
Ela afirmou, então, que decidiu procurar a família do bebê Henzo Matheus. A aposentada mostrou as receitas que o médico havia passado a ela, datadas de março de 2018. “A gente viu na TV e fomos na cidade procurar por eles. A gente sentiu essa dor deles, doeu na alma ver uma criança tão saudável morrer desse jeito”, disse.
O pai do bebê, Rômulo Souza, afirmou que recebeu inúmeros depoimentos de pessoas que foram atendidas pelo mesmo médico. “Tive o maior cuidado de ter certeza que estavam falando dele, mostrei a foto para todo mundo e todo mundo confirmou que foi atendido por ele depois de fevereiro”, disse.
A dona de casa Rosilene Tacaia Rodrigues, de 31 anos, levou o filho de 6 anos para o hospital em junho desse ano e afirmou que também foram atendidos por Foster. Segundo ela, o menino ficou internado no hospital durante quatro dias e precisou ser retirado da unidade após a família descobrir que o médico receitou dipirona, medicamento que a criança é alérgica.
“Meu filho tava com febre alta, vômito e diarreia. Levei ele lá no hospital e ele foi internado porque a febre não tava baixando. Meu filho não teve melhoras e o médico dizia apenas que ele tava com a garganta inflamada e a diarreia era verme. Ele passou um medicamento injetável e eu só o vi no dia que meu filho foi internado, depois não o vi mais, e quem aplicava o medicamento eram estagiárias”, disse.
Ainda segundo a mãe da criança, no terceiro dia de internação, ela percebeu que a criança não tinha melhoras e apresentava outros sintomas como inchaço e manchas pelo corpo.
“Eu pensei que aquela reação só podia ser o medicamento. Eu perguntei das enfermeiras que medicamento que ela estava aplicando nele e ela disse que o médico tinha receitado dipirona e quando eu entrei no consultório dele, além de estar escrevendo a receita e falando no celular ao mesmo tempo, ele prescreveu dipirona, mesmo eu falando duas vezes que o meu filho era alérgico”, disse Rosilene.
Os pais de Rodrigo o levaram para uma outra clínica no município e ele foi diagnosticado com bronquite e já iniciou o tratamento para a doença.
Nos dois casos, o médico estaria atendendo pacientes após ser exonerado do cargo e antes do prazo de 10 dias de voluntariado que cumpriria, segundo a prefeitura.
O G1 entrou em contato com o órgão, mas, até a noite desta quarta-feira (11), não obteve resposta sobre a suposta atuação ilegal do médico e sobe a relação de cargos e salários, bem como o quadro de servidores da prefeitura de Santo Antônio deste ano que estão desatualizados no Portal da Transparência do município.